sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Alternativas para biocombustíveis Cerca de 50 plantas se mostraram promissoras como fontes de energia renovável






Cientistas que procuram a próxima grande fonte de biocombustível, algo como a gramínea Panicum virgatum (switchgrass, em inglês) que usinas de energia poderiam queimar para gerar eletricidade e reduzir suas emissões de carbono, têm uma lista de desejos muito exigente.

Espécies ideais não deveriam ser plantas de culturas alimentares. Elas devem crescer rapidamente e prosperar em terras marginais menos adequadas ao cultivo de alimentos. Além disso, precisam ser resistentes a doenças e pragas, e produzir suficiente biomassa para torná-las competitivas com combustíveis fósseis.

O problema é que plantas com boas possibilidades muitas vezes têm as mesmas características que as tornam espécies potencialmente invasoras, advertiu Lauren Quinn, uma ecologista de plantas invasoras no Instituto de Biociências Energéticas da University of Illinois. Isso levou Quinn e seus colegas a elaborar uma “lista branca” de espécies que poderiam ser adequadas para utilização em biocombustíveis e têm baixo risco de se tornarem invasivas. A pesquisa foi divulgada em julho na publicação científica BioEnergy Research.

Quinn ressaltou que a maioria dos estudos anteriores sobre possíveis plantas de biocombustíveis, ou matérias-primas, se concentrou na identificação de espécies altamente invasoras que deveriam ser evitadas, se possível.
“Realmente não escutamos as boas notícias sobre essas matérias-primas, portanto, a indústria está se perguntando o que fazer”, observou.

Para chegar a uma lista final, os pesquisadores monitoraram o potencial invasor de 120 espécies possíveis com uma ferramenta chamada modelo australiano de avaliação de riscos de plantas daninhas (Australian weed risk assessment model). Ela avalia características como aspectos reprodutivos, tolerância a climas diferentes, composição genética e competição com outras espécies. Plantas com baixa pontuação na avaliação são consideradas não-invasoras, ao passo que as que obtêm uma pontuação elevada são altamente invasoras.

Os pesquisadores reduziram as candidatas a 49 plantas nativas e não-nativas, todas com baixo risco de invasão. Entre elas estão a soja, algumas variedades de eucalipto, gramíneas Panicum virgatum e choupos (ou álamos).

Das 49 espécies finais, 24 são plantas nativas. Mas os pesquisadores sugeriram que essas espécies só poderiam ser utilizadas em segurança como biocombustíveis dentro de suas atuais faixas de propagação. Isso deixou 25 tipos de plantas com amplo potencial para biocombustíveis, salientou Doria Gordon, diretora de ciência da conservação na University of Florida.

Uma erva daninha nociva, com outro nome, funcionaria?

“Não estamos dizendo não produzam biocombustíveis; estamos dizendo vamos ter cuidado e olhar primeiramente para essas 25 [espécies]”, observou Gordon.

O estudo não considerou outras características das espécies citadas na lista branca, como consumo de água ou suscetibilidade a pragas e doenças, fatores que também são importantes para matérias-primas em potencial.

Para Gordon e os outros pesquisadores, o custo de erradicar espécies invasoras supera as desvantagens de plantas menos eficientes. “Mesmo que essas espécies não sejam tão produtivas, temos muito com que trabalhar”, argumentou ela.

Algumas dessas plantas poderiam ser cultivadas seletivamente para produzir mais açúcar, ou maior teor de fibras, acrescentou.

Ainda assim, plantas invasoras como a cana-do-reino, ou cana-gigante (Arundo donax), continuam atraentes para a indústria de energia devido ao grande volume de biomassa que produzem em relativamente pouco tempo. A cana-gigante pode crescer cerca de nove metros em um ano, tem poucas pragas e se propaga em solos menos ricosem nutrientes. Mas ela é considerada uma erva nociva no Texas e altamente invasora, na Califórnia.

No Oregon, a Portland General Electric (PGE) está estudando meios de converter sua usina Boardman, movida a carvão, para uso de biomassa até 2020. Por essa razão, a PGE está cultivando uma lavoura experimental de Arundo donax, informou Steve Corson, porta-voz da empresa.

A empresa está ciente da natureza invasora da planta e está trabalhando com o governo estadual e municipal para implementar controles eficientes de ervas daninhas como parte do processo experimental, salientou.

“Uma das coisas interessantes sobre a Arundo são suas propriedades bastante similares ao milho e à alfafa”, explicou Corson. “Precisaremos de uma grande quantidade de biomassa, portanto, é muito atraente examinar uma planta que faça isso em abundância”.

A PGE também está considerando outras alternativas, como utilizar resíduos florestais e agrícolas, ou sorgo. A usina está planejando realizar uma queima experimental no ano que vem, possivelmente na primavera americana. “Até agora nossas pesquisas sugerem que essa é uma área que vale a pena investigar”, resumiu Corson.

Na Flórida, compre uma licença e deposite uma garantia

Alguns membros da indústria de biocombustíveis já estão estudando algumas opções de culturas menos invasoras. A REPREVE Renewables LLC produz rizomas modificados de Miscanthus x giganteus, um tipo de gramínea perene híbrida e estéril, para ser utilizada como matéria-prima.

A empresa trabalha em estreita colaboração com fazendeiros e até ajuda no plantio e na colheita para garantir que a espécie não se torne invasora. Seu cultivadores empregam zonas tampão ao redor da lavoura como um método para isolar as plantas ali, explicou Jeff Klingenberg, vice-presidente de operações de P&D (Pesquisa & Desenvolvimento) da REPREVE.

Embora a produção de biocombustíveis a partir de fontes vegetais alternativas ainda esteja em desenvolvimento, Klingenberg está cautelosamente otimista. “Acredito que esse mercado crescerá nos próximos anos”, opinou.

Quinn e seus colegas não só querem ver uma crescente utilização industrial de matérias-primas vegetais de baixo potencial invasor, como também gostariam que o governo federal e os estaduais acelerassem suas regulamentações e adotassem uma comunicação mais transparente entre as diversas agências.

A Flórida é um estado que desenvolveu um plano abrangente de manejo para o cultivo de matérias-primas vegetais.

Produtores interessados em plantar no estado têm de pagar uma taxa de US$ 50 e requisitar uma licença para cultivar qualquer área superior a0,80 hectarede terra. A licença inclui perguntas detalhadas sobre as espécies e os potenciais produtores precisam desenvolver um plano e um orçamento para erradicação, caso a planta revele ser prejudicial. Além disso, eles têm de enviar uma amostra da planta para ser identificada positivamente por cientistas da University of Florida, que trabalham em parceria com o estado para combater espécies invasoras.

Se a planta for identificada como um possível problema, autoridades estaduais trabalharão com o produtor para desenvolver melhor as estratégias de manejo, informou Trevor Smith, chefe de escritório da Divisão de Plantas Industriais* do Departamento de Agricultura da Flórida. [Essa divisão se incumbe da detecção, interceptação e do controle de plantas e abelhas melíferas nocivas que ameaçam plantas nativas e cultivadas comercialmente no estado, além de seus recursos agrícolas].

Além da licença, produtores também têm que comprar um seguro garantia no valor de 150% do custo previsto para erradicar a planta. O produtor paga cerca de US$ 200 por ano e o seguro funciona como uma espécie de garantia para o estado, acrescentou Smith. O estado pode descontar a apólice para pagar pela erradicação caso o produtor decida subitamente abandonar a produção.

“De modo geral, os termos da regra estão corretos”, garantiu Smith. “Ela cria um bom equilíbrio para nos manter seguros e não assustar os produtores. Nós realmente acreditamos que a Flórida poderia ser um líder em biocombustíveis, mas queremos fazer isso em segurança”.

Duas regras para a cana-gigante

De acordo com Smith, vários outros estados, inclusive Idaho e Mississippi, pediram informações sobre o modelo da Flórida na esperança de replicar sua abordagem.

Quinn observou que a única falha do sistema da Flórida é que o custo do seguro garantia é muito conservador e não seria suficiente para erradicar completamente uma planta invasora.

A coordenação no nível federal pode ser mais complicada devido à diversidade de agências envolvidas.

Em seu estudo, os pesquisadores ressaltam as políticas aparentemente contraditórias para a Arundo donax no governo federal. Enquanto o Laboratório de Epidemiologia e Análise de Plantas do Departamento da Agricultura dos Estados Unidos (USDA) lista a cana-gigante como altamente invasora, ela foi aprovada para cultivo sob o padrão de combustível renovável (RFS, na sigla em inglês), administrado pela Agência de Proteção Ambiental americana (U.S. EPA).

Em um comunicado, a porta-voz da EPA Enesta Jones declarou: “A EPA se coordena com o USDA em uma base contínua quanto à revisão e aprovação de novas matérias-primas de acordo com o programa RFS”.

Espécies potencialmente invasoras como a Arundo donax têm de passar por exigências regulatórias adicionais para que a planta possa ser registrada como uma possível fonte de combustível renovável. Segundo Jones, os produtores também precisam apresentar à EPA uma carta do USDA que afirma se existe “uma probabilidade significativa de propagação além da área de plantio da matéria-prima”.

“Na realidade, isso é a EPA tentando reduzir o potencial de dano enquanto ainda atende à ordem de aumentar combustíveis renováveis”, observou Chris Dionigi, vice-diretor executivo do Conselho Nacional de Espécies Invasoras, um organismo de coordenação interagências.

Quanto à pergunta se produtores podem estar dispostos a usar espécies da lista branca de Quinn como meio de reduzir o risco de propagação de espécies invasoras, Dionigi concluiu: “Um argumento coerente é que você quase sempre é mais bem-sucedido se der uma alternativa às pessoas”.

Reproduzido de Climatewire com permissão de Environment & Energy Publishing, LLC. www.eenews.net, 202-628-6500

Fonte: Scientific American Brasil

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